ACREDITAÇÃO HOSPITALAR E QUALIDADE EM SAÚDE

A resistência às mudanças é o principal desafio enfrentado por instituições de saúde que querem investir em melhorias e buscam uma acreditação hospitalar. Contudo, muitas equipes não recebem bem a inserção de novos processos e tecnologias, demorando para se adaptar aos modelos recentes de gestão e fluxos de trabalho. Além da insegurança com o que é novidade, muitos temem serem substituídos.

Isso não é tudo: no que diz respeito às acreditações hospitalares, falta entendimento por parte dos empresários em enxergarem a certificação como um investimento e não um custo. Esses exemplos são só alguns obstáculos enfrentados no processo de obtenção das acreditações hospitalares.

Conversamos com José Antônio de Barros, professor e consultor em gestão de saúde sobre o tema. O especialista, que atua há mais de 30 anos em gestão de médias e grandes empresas de Hotelaria e Saúde, comenta sobre as dificuldades que os hospitais enfrentam para conquistar uma acreditação hospitalar, os benefícios e as ferramentas para alcançá-la. Veja o bate-papo completo a seguir.

Acreditação hospitalar e qualidade em saúde: como alcançar a excelência no atendimento ao paciente?

  1. Quais as principais dificuldades que os hospitais enfrentam ao buscar uma acreditação hospitalar? Qual a principal barreira para mais hospitais obterem as acreditações?

“A principal dificuldade é a resistência à mudança de cultura e dos processos. Não de uma forma explícita, é claro. Mas muitas instituições acabam desistindo, quando há dificuldades de alterar os fluxos de trabalho ou as ferramentas utilizadas.

De modo geral, a resistência acontece quando os colaboradores precisam fazer os processos de uma forma diferenciada, de modo participativo e colaborativo, por exemplo. Muitos profissionais não estão acostumados a trabalhar dessa maneira.

Outro desafio é quando há médicos em staff aberto, contratados pelos próprios pacientes para realizar algum atendimento no hospital, como um ato cirúrgico. Eles têm uma dificuldade maior em aceitar as mudanças e processos da instituição, uma vez que não são contratados fixos e não estão adaptados à cultura organizacional.  O restante da equipe vai se adaptando aos poucos, com treinamento e reciclagem constante.

Por fim, em relação aos investimentos financeiros necessários, muitos empresários ainda não veem as mudanças para obter as certificações como investimentos, mas sim como custos. Porém, os hospitais que não perceberem isso vão ter problemas já que cada vez mais os clientes darão preferência às organizações certificadas. A partir do momento que os pacientes tomarem conhecimento da importância da certificação, eles vão pedir isso”.

  1. Quais as ferramentas digitais essenciais para obter acreditações e como elas podem apoiar na obtenção dos selos?

“Não existem ferramentas específicas para obter as certificações. O que acontece é que quando você fala em mudar os processos, algumas tecnologias são essenciais. É o caso do prontuário eletrônico que unifica e padroniza os processos e dados dos pacientes, aumentando a segurança e otimizando o armazenamento de informações.

Em seguida temos os softwares que fazem a modelagem dos processos de negócios, fazendo diagramas para melhorias, como Aries e o BPMN. Eles podem ser obtidos gratuitamente pela internet e são essenciais para organização e controle dos fluxos de trabalho.

É importante destacar que os sistemas devem estar interligados, para que sejam identificadas falhas e erros nos processos. Hoje a maioria da comunicação e gestão é feita em módulos separados, para cada setor.  Com a unificação de sistemas e a padronização dos processos, é possível chegar a um nível excelente de qualidade”.

  1. Qual a importância das acreditações para os pacientes?

“O ponto central para os pacientes é a segurança. O paciente vai percebendo que existem cuidados diferenciados nas instituições que são certificadas. Desde a indicação de um medicamento até a aplicação e registro das informações. Uma instituição certificada tem checagem dupla e uma série de protocolos para evitar erros e ampliar a qualidade no atendimento.

As organizações que trabalham dessa forma, ampliam a vantagem competitiva no mercado, se destacando e aumentando a credibilidade dos serviços. No futuro, as instituições que não forem certificadas irão desaparecer”.

  1. Como a gestão pode preparar as equipes para obter as acreditações?

“Treinamento intensivo e reciclagem. Um termo que usamos muito é descongelamento dos antigos comportamentos. Ou seja, aquilo que eu fazia não posso fazer mais. Toda a cultura da organização precisa passar um novo processo de congelamento, agora de forma mais estruturada, que possa ser padronizada e acompanhada por sistemas informatizados, scorecard como exemplo.

Isso deve acontecer de forma contínua e constante entre os profissionais. Uma possibilidade é a formação de equipes multidisciplinares. Isso permite verificar como os processos em diferentes setores estão sendo realizados e, a partir disso, aplicar medidas para reciclar e adaptar as equipes.  Caso haja algum erro, os processos são alterados, desde a descrição dos cargos, até o manual de conduta dos colaboradores, por exemplo.

Mas é importante lembrar que nem todos terão a capacidade de se adaptar e aceitar facilmente. Ainda há muitas pessoas resistentes aos sistemas informatizados. Contudo não haverá outra forma. Os processos serão cada vez mais virtuais exigindo a digitalização e os profissionais deverão se adaptar a isso, seja para dar feedback, inserir informações dos pacientes ou até responder aos próprios sistemas de acreditação”.

  1. Como iniciar essas mudanças?

“O ideal é que as mudanças nos hospitais sejam feitas aos poucos. Os hospitais podem começar pela descrição de cargos, identificando e registrando de modo detalhado o que cada um faz, como faz, quais equipamentos, condições, e por que está fazendo aquilo. Assim é possível avaliar os cargos e ter uma interpretação de cada atividade.

Sem essas informações, não há sistema de qualidade. Você precisa saber o que e o porquê está fazendo algo, para poder sugerir melhorias e identificar erros. A partir desses levantamentos, há uma maior aceitação das equipes e não há um choque tão grande quando forem aplicadas outras mudanças por consultores externos. Uma vez que a própria organização já deu início a revisão dos processos, realizando críticas internas”.

  1. Como avalia o cenário de acreditações hospitalares no Brasil? Como isso reflete a qualidade do atendimento dos hospitais nacionais?

“Aos poucos a gente já enxerga uma mudança bem significa no mercado. Após a liberação para entrada de grupos de saúde internacionais que possuem certificação, as instituições nacionais passaram a buscar o reconhecimento dos principais órgãos.

Além disso, o processo também passou a ser estimulado pela própria Agência Nacional de Saúde (ANS). Quando ocorre problemas de negociação com operadoras e hospitais e no caso de instituições acreditadas pode haver alguma vantagem financeira, assim, há um maior interesse por parte dos empresários do segmento para certificar as instituições e ampliar a vantagem competitiva dos hospitais brasileiros.

De modo geral, temos a ONA e outros modelos internacionais que vêm sendo praticados no Brasil, com protocolos um pouco diferenciados, e que tem um papel muito importante para ampliar a qualidade e a segurança dos serviços.

Um ponto importante é que quando um hospital é certificado, todos os demais serviços relacionados também precisam ter a qualidade atestada. Assim os serviços terceirizados como laboratórios, e os fornecedores e todos os demais envolvidos, , precisam ser certificados ou ter um meio que ateste a qualidade dos seus serviços. Isso acaba gerando um impacto positivo em todo o mercado de saúde, que deve ser totalmente transformado nos próximos anos”.

 

José Antônio Barros é Consultor Associado da Transparência Consultoria. Especialista em gestão de hospitais, professor, consultor em gestão de saúde e mestre em educação. Há mais de 30 anos atuando na gestão de médias e grandes empresas, já foi diretor e CEO de grandes organizações e na área acadêmica, coordenador de graduação e MBA de Auditoria de Sistemas de Saúde. Há 20 anos, atua como professor nas disciplinas de Gestão de cursos Profissionalizantes, Graduação, Pós-Graduação e MBA. Além disso, foi responsável pela implementação de projetos de Gestão em Geral e de Recursos Humanos e pela criação do curso de MBA Executivo de Acreditação e Gestão da Qualidade em Saúde, da Universidade Estácio de Sá, atualmente leciona na UNICARIOCA em cursos online e na Fábrica de Cursos no projeto Rapid Partner.

Publicado por Pixeon em 24 de setembro de 2019